quarta-feira, 20 de julho de 2016

Conheça a psicologia das cores no cinema em 16 filmes

Pode parecer clichê mas as cores nos filmes são fundamentais, afinal, elas são responsáveis em definir o comportamento físico, mental e emocional de cada personagem ou cena. Georges Méliès foi o precursor em dar cor aos filmes, pintando à mão – “FRAME À FRAME” – apenas pela estética.
Com o passar dos anos, após a inclusão do expressionismo nos filmes, grandes diretores entenderam que além da atuação, a melhor forma de conectar o espectador diretamente seria influenciar suas atitudes e emoções através das cores, em construir climas e atmosferas ou passar mensagens críticas e psicológicas em cada cena.

Na construção visual de um filme ou personagem, o Diretor define junto com a equipe de Arte e diretor de Fotografia o clima e estética. O uso das cores nesse caso é primordial nos figurinos, cenários e iluminação de uma cena, usando tonalidades que “direcionam” a atenção e despertam no público, os sentimentos e percepções desejados.

Por esse motivo, meus amigos, todos os elementos enquadrados na tela são muito bem pensados e posicionados, estabelecendo harmonia de forma única.

As cores podem até passar despercebidas por nós durante um filme, mas a conexão que elas têm (às vezes imperceptíveis) afetam diretamente o nosso psicológico e, tem um papel fundamental no entendimento de ações que muitas vezes não são explicados durante o filme.
Para entender melhor os significados de cada cor:

ROSA/ROXO

O GRANDE HOTEL BUDAPESTE (2014) – WES ANDERSON

budapest 
 Gênio da atualidade, conduz maestralmente planos simétricos e com profundidade de campo, inspirados nas obras do mestre Stanley Kubrick. Brinca com praticamente todos os tons de cores cromáticos em cenas específicas, de acordo com ritmo e emoções da narrativa. Anderson usa fotografia quente (presente) e fria (passado), para distinguir as duas épocas retratadas: a do escritor e a história contada.

O rosa é a cor que compõe o filme. A fotografia puxando mais para o quente acentua a cor dando um ar vintage que nos remete a “infância” e “romance” pelas cores vivas, traz tranquilidade e fantasia. A composição vai muito além do trabalho caprichado da direção de arte, Anderson se preocupa muito com os enquadramentos, é quase uma sequência de quadros pintados à mão (frame à frame). O figurino do protagonista é na cor roxo, que representa sua “pureza” e sofisticação.

UMA CIDADE SEM LEI (2010) – GUY MOSHE

uma cidade sem lei 
 Por se tratar de uma história inspirada no teatro cultural do Japão antigo (Bunraku), os tons de cores do filme são fantasiosos, tudo o que lembra a infância e remete ao imaginário. Pela consequência das guerras, as armas de fogo foram completamente proibidas, mas nessa cidade a violência com armas brancas e grupos de gangues matadores ainda são muito frequentes.

As cores do figurino dos personagens são sempre neutras, o destaque maior é na fotografia. Dificilmente uma cena é composta por apenas uma cor de luz, sempre são usadas cores frias e quentes ao mesmo tempo, dependendo do temperamento da cena. No caso desse filme, o roxo representa a “fantasia” e “sonho”.

AZUL

ALICE NO PAÍS DAS MARAVILHAS (2010) – TIM BURTON

ALICE IN WONDERLAND Mia Wasikowska stars as Alice in Walt Disney PicturesÕ epic 3D fantasy adventure ALICE IN WONDERLAND. A 19-year-old Alice returns to the whimsical world she first encountered as a young girl, reuniting with her childhood friends: the White Rabbit, Tweedledee and Tweedledum, the Dormouse, the Caterpillar, the Cheshire Cat, and of course, the Mad Hatter. In theaters nationwide on March 5, 2010. © Disney Enterprises, Inc. All rights reserved. 
Uma história completamente fantasiosa mistura cores alegres a tons frios, deixando Wonderland um lugar abandonado e triste, que é a proposta do filme já que Alice volta depois de muitos anos. A fotografia fria (azulada) prevalece em praticamente todas as cenas. Como de costume, Tim Burton adora explorar as ferramentas ilimitadas dos efeitos visuais.

A cor do vestido de Alice representa sua personalidade, uma pessoa “calma” e “confiável”. Aqui, o azul é presente não só no figurino, na fotografia e cenários também são constantes. “Fidelidade” e “afeto” fazem parte das emoções retratadas pela tonalidade azul.

NOSSO LAR (2010) – WAGNER DE ASSIS

nosso lar filme 
 Poucos diretores brasileiros sabem respeitar quando e onde usar os tons de cores, independente do gênero. O filme passou batido por muitos, mas é uma obra prima no termo artístico e pouco explorado pelo cinema nacional. O filme conta ainda com uma direção de arte impecável!

Ao contrario da Alice, o azul não compõe a personalidade do protagonista. Aqui a cor representa a “paz” na cidade de Nosso Lar. Wagner brinca com tons de azul e traz personalidade e um “sentimento profundo” de “tranquilidade” e “segurança” ao espectador, independente de sua crença. Um feito único e merece ser estudado.

VERDE

TRILOGIA MATRIX (1999 / 2002 / 2003) – IRMÃS WACHOWSKI

matrix 
 Um dos filmes mais vistos na história do cinema!

Foi o pontapé inicial nas super produções cinematográficas, as Wachowski (na época irmãos Wachowski), praticamente criaram recursos e adaptaram equipamentos tecnológicos ainda não existentes para ficção de Matrix.

Os figurinos e cenários usam cores escuras sem nenhum destaque, o foco maior é na fotografia fria e tons (esverdeado). Por ser uma cor pouco explorada em filmes, de imediato, causa estranheza ao público, em seguida entendemos o porque a escolha da cor, que representa “equilíbrio”. O uso do verde remete a uma pessoa equilibrada internamente, que é o caso dos personagens secundários, Neo por sua vez ainda não o possui, nesse caso a cor representa a “coragem” e “serenidade” em fazer parte desse mundo.

O COZINHEIRO, O LADRÃO, SUA MULHER E SEU AMANTE (1989) – PETER GREENAWAY

O COZINHEIRO O LADRaO SUA MULHER E SEU AMANTE 
 Diretor perfeccionista, usa apenas 5 cenários cada um representado por uma cor diferente.
Estacionamento – Azul: simboliza o drama, a frieza e tristeza.
Restaurante – Vermelho: ira, amor, ciúmes e violência.
Banheiro – Branco: sentimento honesto e puro dos amantes.
Biblioteca – Dourado: inteligência e sofisticação.
Cozinha – Verde: o alimento, símbolo da natureza.
Nesse caso existe uma controvérsia proposital na representação do verde. Além do alimento gerado pela “natureza”, aqui ele representa um outro ponto de vista: é onde os amantes têm suas relações sexuais diariamente. Isso representa o lado animal e selvagem da natureza, a “coragem” em ter relações com o amante de baixo do nariz do marido, ou até mesmo o espírito da “juventude” em se aventurar. Sem contar a percepção do diretor em trocar a cor do figurino dos personagens a cada mudança de cenário… Genial!!

AMARELO

KILL BILL (2003) – QUENTIN TARANTINO

Kill Bill Volume 1 
 Nesse filme o amarelo quer dizer muito mais do que apenas o figurino (marca texto) da Beatrix Kiddo, inspirado no Bruce Lee de Jogo da Morte (1978). Aqui, este tom é predominante, seja na fotografia quente (amarelada) ou figurinos e objetos de cena. As cores quentes vibram na tela e induz o espectador aos sentimentos projetados.

Na cultura Oriental, o amarelo significa “vingança”, isso explica o motivo da cor do figurino. Mas para nós o amarelo também nos remete a “esperança”, “orgulho”, além de ser uma cor que “estimula” o prazer em torcer pela protagonista, fazendo com que uma cena de violência se torne no mínimo necessária para o espectador. O figurino e o cabelo não são os únicos nessa cor, existe também a caminhonete e a moto.

MOONRISE KINGDOM (2012) – WES ANDERSON

Moonrise Kingdom 
 Um Diretor que se denomina autoral, no mínimo explora algumas características únicas em todos os seus filmes. No caso de Anderson são os enquadramentos muito bem estudados e a composição de cores. Desde a fotografia, situando a década de 60, até os pequenos detalhes de figurino e objetos de cenas escolhidos a dedo compõem muito bem a cor amarela.

A cor não só “estimula” os desejos do personagem, como influencia o espectador a sentir “felicidade” e “esperança” ao ver os protagonistas assumirem a aventura em busca da liberdade. Pode-se dizer até que nesse caso ela representa a natureza (por ser um escoteiro) e, trabalha bem a ingenuidade tanto nos garotos quanto nos adultos, que são tão inocentes e puros como as crianças. É engraçado ver a humanização caricata dos personagens adultos nos filmes de Anderson, “humor” presente desde sua expressão, até seu jeito de caminhar ou interagir.

LARANJA

SEM LIMITES (2011) – NEIL BURGER

sem limites 
 Um filme tecnicamente simples, com um roteiro envolvente e que a fotografia funciona perfeitamente bem.

O diretor de fotografia usa duas tonalidades de cor para definir tanto o ritmo quanto o estado físico do personagem. Quando ele é apenas o escritor melancólico, que não consegue ter ideias para terminar o livro, um cara triste e com auto estima baixa, a fotografia é completamente fria, fazendo o espectador sentir pena e até se identificar com o personagem, isso aflora o nosso extinto mais humano: criar o sentimento de compaixão.

Feito isso, o público está nas mãos do diretor nos primeiros minutos do filme. Quando ele toma a droga experimental e faz o efeito em poucos segundos, vemos o personagem dessa forma, “alegre”, com auto confiança suficiente para fazer qualquer coisa. Essa fotografia super quente (alaranjada), nos imprime o sentimento do “prazer” em possuir a droga, picos de “adrenalina” e “tentação”, afinal quem não tem vontade de experimentar vendo a reação momentânea do personagem? Essa cor funciona bem e usa a seu favor de forma “convidativa”.

NA NATUREZA SELVAGEM (2007) – SEAN PENN

na natureza selvagem 
 Filme baseado em fatos reais, e na minha opinião o melhor dirigido por Sean Penn. Aqui ele se mostrou um verdadeiro contador de histórias, o roteiro flui bem, cria-se empatia e compaixão absoluta ao personagem.

Christopher McCandless (Emile Hirsch) acaba de se formar e decide largar tudo, viajando apenas com uma mochila, sem rumo pelos EUA.

O foco desse filme não é contar história a partir de elementos secundários, como figurino, objetos de cena ou até mesmo a fotografia. Aqui a ideia é a trajetória do personagem real, rumo à liberdade. Nessa cena temos a fotografia a favor do sol, que representa o “prazer” e “alegria” em vivenciar pequenos momentos da vida, e o enredo faz questão de nos lembrar dessas pequenas coisas que deixamos de lado por causa de nossas vidas rotineiras. Essa cor atinge o sentimento emocional mais profundo.

VERMELHO

VOLVER (2006) – PEDRO ALMODÓVAR

 
 Mulher: um sexo frágil. Almodóvar aborda esse tema e mostra com sutileza o oposto. Em um universo feminino, onde o homem representa a fragilidade, as mulheres dão um show.
Almodóvar não tem medo de usar o vermelho, por onde você olha em qualquer plano, existe alguma coisa nesse tom.

Em todos os filmes dele essa cor é predominante.

Apenas em três looks da Raimunda (Penélope Cruz) vemos que todos têm o charme da cor vermelha, em que representa muito bem a personagem “forte”, com “sensualidade” e “paixão”.

O “sangue” na faca, seguido da cena anterior, apenas nos confirma que o sexo feminino não é nada frágil, apresentando “violência” de forma rápida e claro, sem perder o charme e sensualidade. Já a fotografia é a clássica (amarelada), acentuando ainda mais as cenas ao “desejo”, deixando o vermelho da faca vibrante, enquanto a luz desenha sombriamente o lado esquerdo do rosto, composição perfeita para a cena.

2001: UMA ODISSÉIA NO ESPAÇO (1968) – STANLEY KUBRICK

2001 A Space Odyssey (1968) 
 Sem dúvida uma obra prima da ficção científica. Kubrick sempre teve liberdade criativa em todos os seus filmes, um diretor difícil de lidar pelo seu perfeccionismo, mas que nos compensa com os enquadramentos simétricos e uma direção de arte e fotografia completamente impecáveis. Nesse caso temos duas situações em que o vermelho representa ações diferentes.

Na primeira temos David Bowmman (Keir Dullea) com uniforme vermelho contrastando o cenário branco e calmo da estação espacial, cena em que antecede os acontecimentos, onde a cor alerta o “perigo” a seguir, ou simplesmente mostrar a “força” como personagem. Situação em que a cor predominante é o foco da ação.
2001 uma odisseia 
 Nesta segunda cena temos a ação do “perigo” acontecendo, “tensão”, “violência”, “guerra”. Por último (e não menos importante), HAL 9000 (à direita) e sua cor vermelho intenso representando o “ódio”. Nesse caso o foco não é só o objeto de ação, e sim o cenário como um todo, luz vermelha iluminando a cena nos dá a sensação de claustrofobia e perigo iminente.

CINZA

INSIDE LLEWYN DAVIS: A BALADA DE UM HOMEM COMUM (2013) – IRMÃOS COEN

inside 
 Os irmãos Coen são mestres em criar atmosferas e situações que favorecem as ações dos personagens. A historia é baseada em um cantor frustrado de folk, que vive de favores e não tem perspectiva nenhuma do futuro. Situação perfeita para trabalhar a melancolia.

O clima do filme é bem trabalhado na fotografia fria, nos passa a imagem de um personagem “triste”. A equipe de arte usa bem a questão do “melancólico” e “sujeira” para compor uma cidade triste e sem esperança. Por ser um artista que vivencia a mudança de seu público pelo gosto musical, faz o espectador entender que ele está ficando “velho” para continuar nessa caminhada da instabilidade, que está ficando cada vez mais no “passado”, mesmo sendo um artista inteligente e que acredita no seu potencial.

ANTICRISTO (2009) – LARS VON TRIER

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 Um diretor único. Ele consegue ser polêmico, aborda temas absurdos, maltrata psicologicamente os atores, é criticado pelo mundo. Mas o grande público (incluindo a crítica especializada) aguarda ansioso a estreia de seu próximo filme, e o idolatram por mais um feito magnífico. Como isso acontece? De novo, sendo um diretor único!

Von Trier consegue retratar a “depressão” com imagens belíssimas! Ele consegue mesclar a “tristeza” da perda com momentos de prazer! Mesmo com esse título, não é um filme de terror, aqui a “melancolia” toma conta de uma das melhores reproduções de suspense/drama do cinema. O ar atmosférico frio, cinza, cativa o espectador da mesma forma que o tormenta. Uma execução de clima gélido magnífica, sem contar com a atuação perfeita da dupla de protagonistas (Charlotte Gainsboung) e (Willem Dafoe).

PRETO

AMANTES ETERNOS (2013) – JIM JARMUSCH

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 Considerado diretor de cinema independente americano, costuma realizar seus filmes com baixo orçamento e total controle sobre eles. ‘Amantes Eternos’ conta a história de um casal de vampiros em pleno século XXI, Adam (Tom Hiddleston) completamente incomodado com a evolução humana se recusa a enxergar um mundo moderno, já Eve (Tilda Swinton) vê o oposto, ela usa recursos da modernidade a seu favor e acredita ser um mundo melhor que os séculos passados. Jarmusch não só usa os tons de preto para compor o filme, como criou um novo universo e concepção para filmes de vampiros.

Pela insatisfação com o mundo nos dias de hoje, a melhor forma de retratar seus sentimentos de “angustia” e “tristeza” é uma fotografia Noir – que trabalha uma escuridão intensa contrastado levemente com uma luz (quente e fria). A “melancolia” e “dor” de Adam são muito bem representados pela cor preta. A trilha feita pelo próprio personagem dá ritmo ao filme criando o clima desejado de profunda inquietação.

LABIRINTO DO FAUNO (2006) – GUILHERMO DEL TORO

labirinto do fauno 
 Del Toro antes de se tornar diretor era especialista em maquiagem de efeitos visuais, isso explica a peculiaridade artística em seus filmes. Pós guerra civil na Espanha, Ofelia (Ivana Baquero) encontra um labirinto em seu jardim e descobre uma imensidão fantasiosa.

As cores trabalhadas aqui são frias, isso remete a época retratada. O preto se torna a cor onipresente na vida de Ofelia, retrata sua “angustia” pela “morte” de seu pai, sua “tristeza” em ver sua mãe se relacionar com o oficial fascista e, a “solidão”. Como toda criança, Ofelia procura se distrair e acaba descobrindo o labirinto e seu novo amigo, Fauno. Tudo isso é representado pela escuridão e o “medo” do desconhecido.

Claro que a arte do cinema está na interpretação de cada um, em muitos filmes as cores são usadas de forma (inocente), não havendo algum significado emocional, apenas estético, pois não existe o certo e errado quando se cria algo novo. Mas a vida faz muito mais sentido quando entendemos quem são os responsáveis em estimular aquele medo de uma determinada cena, o prazer em ver o personagem encontrando a garota dos sonhos, ou apenas pela satisfação em ser um cinéfilo.

Fonte: 1


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